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Artigos

14 de dezembro de 2018
Para onde vai a mobilidade?

Digitalização em prol dos serviços de transportes, eletrificação, veículos autônomos, promoção de formas de deslocamentos não motorizadas, transportes sob demanda e aplicativos, informação e comunicação ao passageiro, e modelos mais modernos de financiamento são algumas das tendências mundiais da mobilidade urbana discutidas em seminário realizado na última terça-feira, 12 de junho de 2017, pela UITP – União Internacional de Transportes Públicos para a América Latina no Sindicato dos Engenheiros do Estado de São Paulo, na região central da capital paulista.

O evento teve cobertura do Diário do Transporte.

Estas tendências mundiais foram apresentadas no Congresso Mundial de Mobilidade Urbana da UITP, que ocorreu entre os dias 15 e 17 de maio, em Montreal, no Canadá, que reuniu 2700 delegados de 84 países, 10 mil visitantes e mais de 300 expositores.

“Em alguns aspectos, o mundo já está bastante adiantado sobre mobilidade urbana, mas em outros, mesmo nos países mais desenvolvidos, as discussões ainda estão em andamento. Estivemos neste seminário em Montreal e compartilhamos nesse evento agora em São Paulo, os principais assuntos discutidos. O importante é entender que hoje as transformações estão sendo muito rápidas e tem gente que pensa que vai bloquear essas mudanças apenas por legislação ou mantendo modelos arcaicos. O mundo não está mais assim e vemos rápidos avanços que muitas vezes gestores públicos e parte da iniciativa privada ainda não conseguiram assimilar plenamente”– disse o presidente da UITP para América Latina e ex-secretário de transportes metropolitanos do Estado de São Paulo, Jurandir Fernandes.

Os especialistas que compareceram ao evento em São Paulo disseram que muitas dessas tendências devem servir de inspiração para ideias desenvolvidas para a realidade brasileira, entretanto, não basta apenas copiá-las.

“Não podemos fazer mais do mesmo e nem prosseguir no vício da imitação barata. hoje são necessárias inovações de fato em produtos e negócios” –  disse Jurandir Fernandes.

Um dos exemplos de tendência em mobilidade é o transporte sob demanda, que é possível por meio da digitalização dos serviços. Hoje digitalização dos sistemas de transportes não é apenas ter um equipamento ou uma central que possam controlar os horários dos ônibus e a gestão da rede metroferroviária, mas oferecer soluções tecnológicas de fácil acesso para que as principais necessidades das pessoas sejam atendidas.

O transporte coletivo sob demanda é como se fosse a evolução do conceito do Uber, que é o transporte individual sob demanda. Já existem experiências de compartilhamento de ônibus e micro-ônibus que são solicitados por aplicativo.

Os sistemas tecnológicos e de algoritmo otimizam as solicitações e orientam a rota desses ônibus, de acordo com os pedidos dos passageiros.

“Nem tudo o que acontece lá fora pode servir para o Brasil e também não basta apenas copiar as ideias porque já existem fracassos também. Ao mesmo tempo que, em março o Chariot, um sistema de transporte sob demanda implantado pela Ford, registrou expansão, o Bridj fracassou em Boston e Kansas. O Bridj era um serviço de vans e minibus sob demanda. A ideia foi boa, mas houve erros de negócios. Foram comprados 50 veículos, houve equívocos na remuneração dos motoristas e os preços foram colocados para fazer frente ao metrô, mas o Metrô é subsidiado. Não se pensou no modelo de negócios” – disse Jurandir Fernandes.

Ainda no conceito de que a digitalização é ferramenta para a tendência de oferecer a mobilidade como um serviço completo, atendendo às mais diferentes necessidades, foi discutido um exemplo da Finlândia, onde é possível contratar “combos” de deslocamento, com opções pré-determinadas de quantidade de viagens de táxis necessárias por mês e variações de horários para solteiros, empresas e famílias completas. É possível conseguir descontos e prever os gastos.

Hoje também a tendência de aplicativos de transportes não é apenas fazer a conexão entre usuários e motoristas, mas também numa mesma ferramenta oferecer opções como restaurantes hotéis e linhas de transporte público compreendidos na rota escolhida pelo passageiro. Essas opções que aparecem na tela variam de acordo com o destino escolhido.

“Para ver como a digitalização é rápida e importante e reúne números expressivos, somente no Brasil, vamos alcançar 160 milhões de smartphones. Se levarmos em conta que cada aparelho custa em média R$ 1 mil, a população investiu R$ 160 bilhões nesses aparelhos. A mobilidade urbana, os serviços, o planejamento e a comunicação com usuários do transporte devem estar inseridos cada vez mais neste mundo digital. Esse valor investido pelo brasileiro é bem superior ao que muitas vezes o governo e as empresas precisam e não têm para aprimorarem os serviços de transporte.” – disse Jurandir Fernandes.

 

DESLOCAMENTOS NÃO MOTORIZADOS, ELETRIFICAÇÃO e VEÍCULOS AUTÔNOMOS:

Considerado comum nos países mais desenvolvidos, mas que nem por isso está fora dos planos de mobilidade e que deve ser seguido por outras regiões do mundo, é o incentivo à mobilidade ativa, ou seja, aos deslocamentos não motorizados, como a pé e por bicicleta, segundo os palestrantes.

A bicicleta está presente de forma estratégica em praticamente todos os sistemas de transportes, recebendo a valorização necessária. Além de ciclovias e ciclorrotas, a conexão com os sistemas de ônibus e metrô é constantemente aperfeiçoada, com áreas cada vez mais modernas para as pessoas deixarem suas bicicletas confortavelmente e em segurança para continuarem seus deslocamentos em transportes públicos.

O compartilhamento de bicicletas é uma prática que só tende a crescer.

Valorizar o pedestre, oferecendo condições dignas de deslocamentos, com calçadas em perfeitas condições, e segurança, inclusive com zonas de restrição de velocidade dos carros em áreas de grande concentração de pessoas, já é comum no mundo desenvolvido e precisa ainda se tornar corriqueiro nos demais países.

Mas há avanços. Nesta quarta-feira, o prefeito de São Paulo João Doria sancionou o estatuto do pedestre, feito em parceria com ONGs e técnicos, contendo exigências tanto ao poder público como à inciativa privada.

A eletrificação dos sistemas de transporte sobre pneus, em especial serviços de ônibus, também é uma tendência palpável e que já está presente nos planos dos países mais desenvolvidos.

No dia 07 de junho, o Diário do Transporte trouxe em primeira mão, um estudo da AIE – Agência Internacional de Energia que prevê que o crescimento da frota de veículos elétricos em todo mundo deve ser em torno de 30% até 2030. Hoje são dois milhões de veículos desse tipo, sendo que 346 mil unidades apenas de ônibus. Desse total de veículos de transporte coletivo, 343,5 mil unidades estão na China.

A estimativa é que as frotas de ônibus elétricos cresçam nos principais países desenvolvidos. Entretanto, existem alguns desafios e questões que precisam de respostas, como incentivos fiscais diante do preço ainda maior desses ônibus em relação a modelos similares a diesel; criação de áreas prioritárias nas zonas urbanas, principalmente centrais; definição do preço de infraestrutura; autonomia e preço das baterias e operação e manutenção dos veículos.

Com ganho de demanda e investimentos ainda mais compromissados, muitas destas questões, como o valor dos veículos e das baterias, além do preço da infraestrutura, tendem a ser equacionadas com o tempo.

Jurandir Fernandes defendeu eletrificação dos sistemas de ônibus em realidades como a brasileira e disse que em termos de distribuição, é mais barato gerar e fornecer energia elétrica que outras matrizes.

“No Brasil, a geração de energia elétrica é limpa. E mesmo onde não é, a eletromobilidade está evoluindo de maneira fantástica. Hoje o petróleo e o gás devem ser usados para gerar energia elétrica. Em vez de canalizar todo gás para distribuir depois, é mais interessante gerar a energia elétrica, que já vai poluir menos do que se todos os carros continuarem a ser movidos por combustíveis fósseis, e a rede de distribuição já está pronta. Não precisa canalizar tudo como acontece com o gás natural. A eletrificação não é fantasia e o Brasil precisa estar mais atento” – disse Jurandir Fernandes.

Outro aspecto fundamental para que o transporte elétrico ganhe ainda mais escala é a padronização dos sistemas e estruturas em todo o mundo. Não adianta ter modelos com sistemas muito diferentes, o que inviabilizaria a participação em variados mercados e a modernização com o tempo das frotas e infraestrutura.

“Não podemos fazer com os ônibus elétricos o que acontece com as tomadas, uma com padrão europeu, outra com padrão norte-americano, outra asiática e assim vai …” – afirmou o presidente da UITP.

Os veículos autônomos, apesar de ainda estarem em desenvolvimento, já não podem mais ser considerados como algo do futuro e, sim, uma realidade em expansão.

Em Sion, na Suíça, desde o ano passado foi concebido um circuito fechado com veículos de transporte coletivo de pequeno porte, que andam sem motoristas.

Singapura já tem um departamento de veículo autônomo para elaborar planos de rotas isoladas e sistemas.

Entretanto, ainda são necessários aprimoramentos tecnológicos e na legislação.

O desenvolvimento deve ser aos poucos num processo gradativo de automação.

Inicialmente a maior parte das operações desses veículos deve ser assistida, para depois a autonomia ser parcial, passando para alta, depois plena, onde ainda há interferência humana, até chegar o estágio de driverlees, com quase nenhuma participação humana no funcionamento do sistema.

Em relação ao transporte de carga, os veículos autônomos também são tendência. Em alguns sistemas de longa distância, há uma participação mista entre tecnologia e ser humano na condução dos veículos. Os caminhões que seguem por longas rotas vão em comboio. O primeiro veículo é guiado convencionalmente por um motorista e os caminhões de trás já são autônomos e seguem o condutor humano.

E O DINHEIRO PARA AS INOVAÇÕES E INVESTIMENTOS?

Todas essas inovações e aprimoramentos para mobilidade urbana custam dinheiro e esbarram em questões como a forma de financiamento mais adequada.

Existe na UITP a TEC – Transport Economics Commission (Comissão Econômica para os Transportes) que busca justamente verificar os modelos que tem dado resultado e os que parecem mais lógicos.

O CEO da empresa Addax, Flavio Chevis, disse que as PPPs – Parcerias Público-Privadas têm sido cada vez mais valorizadas e olhadas com atenção por gestores governamentais e por todos no setor de mobilidade.

“As PPPs ainda são algo relativamente novo nos Estados Unidos, mas na Europa já estão bem avançadas. No Brasil, já temos boas experiências. Equilibrar o poder público e privado é tendência para diversos setores e com a mobilidade não é diferente” – disse Flavio

A Addax juntamente com a EMTU – Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos, do Governo do Estado de São Paulo, foram premiadas no Congresso Mundial da UITP em Montreal devido ao VLT – Veículo Leve sobre Trilhos que liga Santos a São Vicente na Baixada Santista.

A Addax é uma empresa que atua no segmento de modelagem financeira e estruturação de parcerias no setor de infraestrutura. O VLT não foi premiado como modal, mas sim como modelo de negócios.

Os serviços são em parceria entre o Governo do Estado de São Paulo e a BR Mobilidade, do Grupo Comporte, de Constantino Oliveira, que também opera ônibus na região.

O executivo também explicou que ainda está em discussão no mundo, com pouca prática, mas podendo ser uma tendência, a captura de valorização imobiliária em prol do transporte, conhecida no Brasil como contribuição de melhoria, isto, é toda vez que uma obra de transporte valoriza determinada região, o segmento de mobilidade deve receber do mercado imobiliário uma contrapartida, que seria utilizada para mais investimentos e manutenção das atuais redes.

Flavio disse que esta captura é comum em Hong Kong, onde a receita da rede do metrô é formada em 50% pelas tarifas e a outra metade por outras fontes, como a valorização imobiliária.

“Mas Hong Kong não pode ser considerado um exemplo aplicável a outras realidades porque lá a terra é propriedade do governo. Assim é o poder público quem determina as áreas e o metrô lucra com a valorização imobiliária e a exploração comercial nos arredores” – explicou o executivo.

 

O MUNDO NOS TRILHOS:

Apesar de as inovações em aplicativos de carona e compartilhamento de carros de passeio serem tendências que não podem passar em branco pelos investidores e também pelo poder público, o que as grandes concentrações urbanas necessitam no mundo atual é de transporte público de alta capacidade.

É o que defendeu no seminário o presidente da Via Quatro, Concessionária da Linha 4 Amarela da rede de metrô de São Paulo, Harald Zwetkoff.

“O mundo antigo privilegia o transporte individual motorizado, seus investimentos são para ampliar a capacidade das vias para receber mais carros e há pouca preocupação em relação ao meio ambiente. Já o mundo atual demanda por transporte de alta capacidade e vê na mobilidade urbana um dos elementos para se conquistar a qualidade de vida. Todo corredor acima de 30 mil pessoas hora sentido tem de ser metrô. No adianta monotrilho e VLT. Acompanhamos mundo afora investimentos em modernização e ampliação das malhas de metrô de alta capacidade” – contou o executivo, que também é engenheiro.

Harald Zwetkoff também destacou a necessidade de os sistemas metroferroviários estarem cada vez mais conectados às redes de ônibus que ofereçam qualidade.

O profissional também cita importância da manutenção e ampliação dos investimentos para sistemas de bilhetagem inteligentes

“Em relação à bilhetagem, o mundo está muito desenvolvido e precisamos absorver mais isso. Por exemplo, em Londres há um sistema tecnológico na bilhetagem eletrônica que calcula o que é mais vantajoso para o passageiro de acordo com seu perfil de viagem, indicando as opções de preços e integrações. É algo muito interessante que atrai também pessoas para o transporte público” – disse Harald.

ABERTURA DE DADOS, COMUNICAÇÃO E COLABORAÇÃO:

O que investidores e gestores não podem perder é a visão de que o transporte é feito por pessoas e para pessoas e que, apesar de todo o desenvolvimento tecnológico, é o ser humano que deve continuar sendo o elemento principal na mobilidade urbana.

Para isso a comunicação e a informação são elementos essenciais. A própria sociedade se mobiliza em relação a isso e cada vez mais os perfis colaborativos ganham importância.

Quem explica é o diretor da Scipopulis, Julian Monteiro, startup responsável pelo aplicativo Coletivo, que informa os passageiros sobre horários e previsões sobre as linhas de ônibus. Além disso, por usar dados do sistema Olho Vivo da SPTrans – São Paulo Transporte, gerenciadora dos serviços na capital paulista, o aplicativo gera também um banco de dados sobre as condições das vias e problemas frequentes por onde passam os ônibus, o que pode ser usado em decisões estratégicas no trânsito.

“Apesar do caráter colaborativo com maior participação da sociedade por meio de toda a tecnologia, é necessário que gestores e operadores de transportes tenham os seus dados abertos para deixar transparentes as informações essenciais para o planejamento do próprio cidadão quanto aos seus deslocamentos. A informação também pode ajudar e muito na otimização e eficiência do transporte público e até mesmo na gestão do trânsito ao diminuir viagens desnecessárias. Mas infelizmente, vemos que ainda 90% das cidades brasileiras ainda não têm mapas digitais de suas redes de transportes” – contou.

A comunicação com passageiro é essencial para a própria organização dos sistemas como um todo e também para aspectos pontuais.

A chefe do departamento de relacionamento com o usuário do Metrô de São Paulo, Cecília Guedes, comentou no evento os resultados da campanha da empresa contra o abuso sexual.

Segundo Cecília, a campanha intitulada “Você não está Sozinha” nasceu diante da necessidade de uma reação frente aos casos que ocorreram nas composições e estações.

Inicialmente, a companhia do Metropolitano se valeu de pesquisas em relação à demanda e constatou que 56% dos passageiros que passam pelas linhas do metrô paulistano são mulheres. Desse total, 90% acessam a internet e metade tem entre 18 e 24 anos. O Metrô então fez parcerias com ONGs e Defensoria Pública e seguiu as seguintes diretrizes: foco na vítima, prevenção e responsabilização. Foram realizadas ações com públicos externos e internos dando origem à campanha. De acordo com Cecília, em 2011 , por meio do SMS, o número de queixas sobre abusos foi de 12 relatos. Em 2016, o total já era de 195 registros. O problema não estava no número de assédios e ocorrências de abuso que aumentavam, mas na subnotificações anteriores.

“Com a campanha, mais mulheres se sentiram estimuladas a denunciarem, o que acabou ajudando na repreensão e prevenção desse tipo de crime” – disse Cecília.

Ainda dentro do aspecto da comunicação na área de transportes ser voltada para o ser humano e sua valorização, um exemplo de caso brasileiro foi premiado no Congresso Mundial de Mobilidade urbana da UITP.

Trata-se da campanha realizada pela Autopass, responsável pelo Cartão BOM, usado nos ônibus do sistema da EMTU, na CPTM e no Metrô, quando foi atingida a marca de seis milhões de cartões.

Com o lema, “6 Milhões de Cartões e milhares de histórias”,  a campanha procurou ressaltar que os cartões eram um detalhe apenas em toda a cadeia de transportes e o que importa mesmo são as pessoas e histórias do dia a dia presentes na mobilidade.

“ O plástico [cartão] é o que menos importa. Trabalhamos com vidas, com pessoas e surgiu a ideia de valorizar estas pessoas. Sabemos que nos transportes há muitas histórias. Então, o cartão recebeu diversos rostos. Criamos um blog para as pessoas mandarem suas histórias, uma mais interessante que a outra. A ideia se ampliou e fechamos uma parceria para que algumas histórias fossem divulgadas nas rádios do Grupo Bandeirantes. Foi muita legal e humanizou a imagem do transporte. Depois, a campanha com jingle foi veiculada como comercial na TV Globo” – explica o responsável pelo departamento de comunicação da Autopass, Roberto Sganzerla.

Já é a terceira vez que a Autopass é premiada no Congresso Internacional da UITP, contando com outros trabalhos.

 

ADAMO BAZANI

Link: https://diariodotransporte.com.br/2017/06/15/para-onde-vai-a-mobilidade/

Data: 15/06/2017